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Entrevista com Agnaldo Silva, o mais novo imortal da AML
O primeiro docente da Unemat a ocupar uma cadeira na AML acredita que a leitura é um hábito que se desenvolve gradativamente, influenciado pelo ambiente onde se vive.


Agnaldo Rodrigues da Silva, eleito em fevereiro para ocupar a cadeira número dez da Academia Matogrossense de Letras (AML) é professor universitário, natural de Cáceres, nascido em 20 de janeiro de 1973. Primeiro docente da Universidade do Estado de Mato Grosso a ser imortalizado pela AML tomou posse na última semana em Cuiabá. Pós Doutor em Letras pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, na Unemat Agnaldo Rodrigues é coordenador do Centro de Pesquisa em Literatura e presidente do Conselho Editorial da UNEMAT Editora. O escritor também é líder do Grupo de Pesquisa em Estudos da Arte e da Literatura Comparada Unemat/CNPq. Dedica-se ao estudo da literatura e do teatro, sendo considerado pela crítica como um dos escritores mato-grossenses da contemporaneidade.



 



Unemat: Quem é o escritor Agnaldo Silva?



A.R.S.: Sou cacerense, amante desta Princesinha do Paraguai e, por isso, sempre saio e volto a Cáceres. É a cidade do meu coração. Sou amante da leitura de um bom livro, amo a minha profissão de docente e o ofício da escrita literária. Em relação a minha produção, costumo dizer que escrevo cientificamente porque é uma exigência da universidade e isso se torna um hábito. Passamos a escrever por gosto. No caso da criação literária, é uma opção, quer dizer, faço esse tipo de escrita porque gosto de criar mundos, habitá-los com seres de papéis, que chamamos na teoria literária de personagens. Essa criação aproxima-me mais dos leitores, traz um tipo de realização pessoal. A cada novo livro, é como se eu estivesse presenteando o mundo com novas possibilidades de vida. Agnaldo Rodrigues é tudo isso: cacerense, professor, escritor, sonhador e apaixonado pela cidade onde nasceu e vive.



Unemat: O que veio primeiro o universo de Letras ou o Cultural?



A.R.S.: Penso que as duas coisas foram se desenvolvendo mutuamente. Sempre gostei de ler. Nunca fui gênio, mas esforçado. Tudo que sei e conquistei foi com base na leitura, na busca permanente da superação. Em termos de atividades, a cultural veio primeiro. Comecei no teatro. Desde cedo, ainda na educação básica, eu já me voltava para essa prática cultural. Fui ator e diretor de grupo teatral. Participei de festivais, com premiações era tudo muito legal. Durante o ensino médio desenvolvi teatro, depois na universidade e, por fim, já docente, eu ainda dirigia grupos de teatro e atuava. Interrompi as atividades com o espetáculo teatral quando me afastei para qualificação docente, em níveis de mestrado e doutorado. Hoje, não atuo mais em espetáculos, mas continuo sendo um pesquisador do teatro. Todas as minhas teses foram voltadas ao teatro. A atividade literária sistematizada começou em 1998, quando ingressei, como concursado, na Universidade do Estado de Mato Grosso, ocasião que iniciei um estudo sobre a poética de Chico Buarque. Em 1999, comecei a produzir contos e publicar no Jornal Universitário de Tangará da Serra. De 99 a 2003 publiquei contos em coletâneas de contos brasileiros e em 2004 foi publicado o meu primeiro livro de contos, intitulado A penumbra – contos de introspecção, que foi muito bem recebido pela crítica.



Unemat: Como lhe cai o título de imortal da AML? O que este título representa em sua vida pessoal e profissional? Muda alguma coisa daqui para frente?



A.R.S.: É, sem dúvida, uma realização pessoal e profissional. Como escritor, eu sempre sonhei em pertencer a Academia. E agora tenho esse sonho realizado. O que muda é a responsabilidade que se torna maior, em relação ao que produzo. A imortalidade, na verdade, dá-se pela consolidação da produção do escritor; e o reconhecimento sociocultural da escrita e isso se busca produzindo com qualidade. No mais, continuo o mesmo Agnaldo, sempre descontraído e simples. A pessoa que gosta de sentar em roda de amigos para conversar sobre teatro, literatura e cinema.



Unemat: Este título dará maior visibilidade a Editora da Unemat, uma vez que ocupa o cargo de Presidente do Conselho Editorial da Unemat?



A.R.S.: Penso que são questões distintas. Da Unemat, tenho sentido um reconhecimento diante de minha eleição na Academia das Letras mato-grossenses, e isso me deixa muito contente. Agradeço a Unemat por toda formação que tenho, pois nela estudei graduação, depois, já docente, pude me qualificar em níveis de mestrado, doutorado, pós-doutorado; ainda publicar livros e revistas. Amo a universidade, costumo dizer “minha casa”. Digo isso positivamente, porque me criei intelectualmente nessa instituição. Sempre tive o carinho dos alunos, dos colegas, dos dirigentes. Quando à editora da Unemat, já estive na presidência do Conselho Editorial em anos anteriores. Agora, nesta gestão, estou no terceiro ano na direção do setor, tanto como Assessor de Gestão quanto Presidente do Conselho Editorial. Isso tudo para dizer que a minha entrada para academia talvez tenha indicado que estou no lugar certo, um espaço de produção intelectual e cultural, ou seja, a editora de uma universidade.



Unemat: Entre as suas publicações, destacam-se: A penumbra, Mente Insana e Dose de Cicuta (criação literária); Projeção de Mitos e Construção Histórica no Teatro Trágico, Diálogos Literários e Escritos Culturais (científicos). Como a inspiração lhe bate a porta?



A.R.S.: Eu vejo a inspiração como motivação. Quando produzimos sempre há algo para lhe motivar. Costumo dizer que a produção literária é mais transpiração do que inspiração, tendo em vista que é um trabalho intelectual. Para realização desse trabalho, o escritor precisa estar antenado com o mundo, compreender a história, entender as diversas áreas do conhecimento humano: sociologia, filosofia, psicologia, geografia e outros. Penso que a inspiração não bate a porta, mas somos nós que batemos na porta dela.



Unemat: Agnaldo você é capaz de dizer qual deles é seu melhor trabalho sob seu ponto de vista e por quê?



A.R.S.: Pergunta difícil e complicada. Talvez eu possa dizer sobre os trabalhos que os leitores mais procuram ou me questionam durante aulas ou palestras. Na criação literária, o livro mais visitado é o Mente Insana que foi publicado em 2008. É um livro que as pessoas ainda me param para comentar o enredo, as personagens e outras questões. Na produção científica, o livro mais visitado é o Projeção de mitos, onde eu analiso o teatro de Chico Buarque, comparando com as tragédias gregas e portuguesas. É um livro que as pessoas sempre conversam comigo durante eventos. Esse livro é o resultado de minha tese de doutorado, realizado na Universidade de São Paulo e orientado pela escritora brasileira Nelly Novaes Coelho.



Unemat: O Brasil não é tido como uma nação de muitos leitores. Livros são considerados artigos caros. Como é ser um escritor autor de diversas publicações num cenário como este?



A.R.S.: Essa é uma questão que realmente se põe em nosso país. No caso de Mato Grosso a questão é mais complicada, porque somos considerados um estado periférico, ou seja, somos a periferia da periferia. Nossas publicações circulam pouco. Para que nossos trabalhos tenham boa circulação precisamos publicar em editoras de grandes centros: São Paulo, Rio, Curitiba, de modo que tudo sai bem mais oneroso. Mas temos feito o nosso papel. Eu, assim como outros escritos, tenho publicado livros tanto no estado quanto fora dele.



Unemat: Qual sua visão com relação ao incentivo à leitura nas redes de ensino tanto pública quanto privada no Brasil?



A.R.S.: Há, hoje, no país muitos programas de incentivo e isso tem feito a diferença no trato com a leitura nas escolas. Fiz parte, nos últimos três anos, de dois programas do Ministério da Educação que permitem o trabalho integrado entre universidade e escolas: tratam-se dos programas PIBID e NOVOS TALENTOS. Fui o coordenador desses programas na Unemat e pude estar em contato direto com as escolas, trabalhando com alunos e professores. Percebi que os professores da educação básica tem motivações para um trabalho diferenciado e estão prontos para inovar. Foram receptivos às novas metodologias que levamos e também aprendemos muito com eles. Nessa direção, penso que o Ministério precisa continuar investindo nesses programas e criar outros, porque têm feito a diferença na educação brasileira. Quanto a rede privada, os contextos são outros. Eu não teria subsídios para uma análise neste momento, tendo em vista que minhas relações sempre foram estabelecidas com a rede pública.



Unemat: O gosto pela leitura pode ser ensinado e ou herdado?



A.R.S.: O gosto pela leitura pode ser desenvolvido. Na verdade, penso que todos nós temos essa potencialidade, pois o que precisa é de motivações. A família e a escola são agentes fulcrais nesse processo de aquisição desse hábito. O gosto desenvolve-se pelo hábito e tudo vai se tornando natural. Eu não diria ensinar a ler ou que já nascemos com ou sem motivações para leitura. Acredito que é uma questão de formação. Um hábito que se desenvolve gradativamente, influenciado pelo ambiente onde se vive.



 



 


Por: Hemilia Maia